quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Heróis Sem Tempo


                                       Madalena com o meu irmão Zé Mau e eu, João, no Casino



Aos 17 e 18 anos éramos tontos. Apresentávamo-nos com vestidos de renda francesa, pretos, complicadíssimos de cocktail das bisavós e cintos de crocodilo (eles) sapato de sola do melhor couro que, rapidamente, desse o giro na cintura da namorada (que calçava sempre 12 cm de salto) como se ela voasse naquelas festas do Casino ou nas mais privadas, depois dos prémios do Cross ou das medalhas em modalidades várias.
Éramos todos heróis.
A maquilhagem era uma descoberta das revistas e dos postais muito ilustrativos tipo George Benson, que, na altura, se dançava como se de um deus a honrar se tratasse.


A Madalena era uma vamp no melhor sentido da palavra. Gira e coquete "comme il faut". Eu, fumava de boquilha e guardava os cigarros na cigarreira trabalhada em prata do bisavô Castilho da Costa.
Não pensávamos em nada como "que fazer aos 21 anos?"Tínhamos, incrivelmente, chegado a adultos e o palco era nosso. Íamos ter 18 anos para sempre.
A vida foi adquirida e nós éramos de uma geração entre a boémia e a revolucionária, conforme os dias.
Amávamos amar e talvez isso nos tenha matado um alvéolo de Alma, importante e desconhecido. Desafiámos desafiar porque nos era prometida a adrenalina desde sempre.
Fomos educados nos bancos da escola do tempo de Caetano, pós Salazar, e aos 12, 13 anos, apresentaram-nos uma revolução que contrariava o sonho de descobrir as vias férreas do Ultramar e o sonho de um império, desconhecendo-lhe as manhas e os vícios estranhos, torturas vis.
Crescemos a sonhar construir e fizémo-lo. Inventámos os eventos, driblávamos a burocracia e fomos pais de sonhos. Mas íamos morrendo. Os que ficavam aditos ao conforto daqueles ciclos apertados de interior, assim permaneceram. Os outros desafiaram o mundo para fingir que interior era a sala de onde nunca sairam e onde permaneciam aquelas amigas da salsa e rock das festas do casino, as vamps dos 80, as casas das grandes famílias. E vimo-las desmoronar. Primeiro, devagarinho...depois, de um ápice, os que se tinham feito à vida cairam como presas fáceis de quem tinha ido jovem e inconsequentemnte irresponsável.
Era giro, na época, morrer jovem como Marilyn e James Dean. Nenhum de nós imaginava um dia ter 50 anos. Fazer coisas, sim. Ser...era mais complicado.
O que é certo é que, os que chegámos e tanto fazemos para cumprir uma parte do Bem Comum no dia seguinte, não chegamos para prender a mão de quem nos pede ajuda e nos implora que deixemos a sala fechada, que cimentemos a porta.
Quando a Rosinha Carvalho me partiu o coração a chorar por estarem "a mexer no nosso rebanho", na morte do nosso Corvo, logo a seguir ao Mendonça e antes do Carlinhos Cardoso, eu não compreendi muito bem porque é que nos unia o que nos dividia, entre depressivos, sobreviventes, empresários, artistas, loucos.
Agora acho que o problema desta geração foi sociopolítico e conjuro os mesmos de sempre, os que requentaram o couro dos cadeirões do Parlamento, a desviarem um pouco dos seus tostões de ávidos politiqueiros, à História sociopolítica da geração de Abril.
As descontinuidades neste país, os empurrões sem páraquedas e, agora, o desamparo absoluto de quem precisa, psicologicamente, antes de tudo, de se sentir no interior, escandalizam-me.
Madalena era neta do grande Severo Biscaia e filha de Madalena Biscaia Azeredo Perdigão. Mãe e avô, também. Mas essa história cabe ao futuro.
Foi casada com José Carlos Castilho, artista plástico, até há pouco tempo proprietário do Bergantim na Figueira da Foz, com o irmão, António.
Paz à conturbada alma de Madalena.



1 comentário:

Maria disse...

Que lindo Maria João e que bela homenagem à querida Madalena.