Lembras-te, Zé, quando o Cardosão serviu o perú recheado que trouxémos da quinta de meu pai com requintes de malvadez? Praia fora...glu glu glu que não pode sufocar com tanta aguardente, tadinho? O porta-bagagens do carro aberto enquanto deslizava ao longo da praia, para sua excelência vir cair e uns cinco marmanjos loucos à volta do animal gurgurujando glugluglu....era uma aguardente velha e peras, que também vinha da adega de família e fora provada por todos para terem a certeza de que dava carne tenra. Glu Glu.
O Chico da Goretti a cozinhar o aprumo do recheio, o Corvo a polir as pratas, o Mau a desfazer-se em gentilezas para que todos tivessem o que necessitassem....e o Cardosão de pano de linho branco no braço, travessa de prata com perú recheado e alguém ao fundo da mesa a fumar um cachimbo de água. Todos de guardanapo de linho a benzer a vida que nos era tão leve...A carninha boa e tenra, a companhia boa, os vinhos velhos e aguardentes mais ainda a concavarem os murmúrios, a aconchegarem a voz e a indisciplinarem os segredos.
Não sabíamos ainda o que cozinhar com tantos ingredientes; as ervas, os bichos, arranjar os bichos, amaciá-los e prepará-los para dar um sabor diferente em qualquer cozedura. Fizémo-lo à experiência. Como se tivessem largado diferentes Karts da linha de partida. Ás quatro da tarde, os meus amigos tinham todos percebido quem iria para hotelaria e turismo e eu estava a leste de qualquer rivalidade.
A digestão fez-se, depois de arrumado o salão , a copa e a cozinha, com uma corrida pelas Abadias...Os Zés chegaram primeiro.Pelo caminho o Corvo perdeu os óculos de sol que eu tanto lhe gabara. Uns anos depois perguntei-lhe se estava mesmo convencido de que eu tinha ficado com eles. Sorriu...sorriu muito e disse: glu glu. Glu glu glu.
domingo, 15 de março de 2009
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